Viver é fácil. Difícil é morrer.

Alessandra da Veiga
3 min readAug 29, 2023

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Photo by Evie S. on Unsplash

Desde que me entendo por gente, escuto dizer que viver é difícil. Pra alguns é mais fácil, pra outros é difícil pra caramba porque prece que tudo conspira contra.

Talvez, em via de regra, viver realmente seja difícil de acordo com a realidade de cada um. Só você, você mesmo que tá lendo esse texto, sabe o que já passou pra chegar até aqui.

“Aqui” pode ser qualquer coisa: o final do dia, o final da semana, concluir uma faculdade ou finalmente passar naquela vaga que queria. Ou quem sabe ainda sair daquela depressão ou daquele emprego que mais te afundava do que te colocava pra cima.

A concluí é que viver tem os seus momentos. Viver é difícil, mas morrer é mais, principalmente quando alguém querido vai embora.

Pra quem partiu, já não faz mais diferença se faz sol de manhã ou se vai chover ao final da tarde. Pra quem foi embora, as preocupações acabaram. A pessoa está aqui num dia e no outro já não está mais. Quanta coisa foi vivida e, puft, acabou.

Não tem mais os dias de verão, não tem mais os abraços de quem você ama, as ligações de longos minutos, as risadas, o perfume, a voz que aquecia o coração.

Não tem mais os planos para o futuro e as memórias que ainda iria construir, nem se fala. Elas nunca existirão. Na verdade, as memórias depois que alguém morre são todas à base do “e se ele/ela estivesse aqui hoje”.

Os olhos se fecham num sono profundo pra nunca mais acordar. Tudo fica escuro, os batimentos desaceleram até que a sinfonia cardíaca para de vez. Em sua última conexão com o mundo real, o cérebro diz: adeus. Parece mágica, mas é só a vida. Daí você morre e deixa tudo por aqui.

Você já parou pra pensar na burocracia que é morrer? Provavelmente não porque acho que ninguém fica pensando nisso. Mas a verdade é: quem vai cuidar de todas pendências depois que você for embora?

Morrer, pra quem vai embora, é tão simples quanto respirar. Para quem fica, a dor é tamanha que o mundo parece estar de cabeça para baixo. É no pós-velório que os problemas começam.

Mexer nas coisas de quem foi embora é entrar na intimidade sagrada dela. É estar em um campo que não é o seu. Sobretudo, é mexer em uma ferida que, talvez, demore muito mais para fechar do que você imagina.

É necessário pensar sobre o que fazer sobre as roupas. Quantas peças compradas ao longo da vida que, naquele momento delicado, a única questão é: doar ou deixar do jeito que está? Ninguém pensa nisso em vida e é muito mais difícil fazer isso quando nos deparamos com a morte.

E quanto aos eletrodomésticos? Se tiver uma casa própria, o que fazer? Alugar ou deixar fechada como se nada tivesse acontecido? Deixar as memórias construídas naquele lugar intactas?

As fotos na parede? Guardar ou chorar pelo tempo que precisar? E as miudezas que as pessoas acumulam ao longo da vida? Se tiver um animal de estimação, a coisa complica ainda mais porque quem vai ser o sortudo que vai herdar, de surpresa, um pet?

Nem preciso mencionar as pendências de banco. Ir em banco já não é uma experiência agradável em vida, quem dirá ter que tomar partido para fechar a conta de uma pessoa que já foi embora.

Ninguém se programa para o encontro com a morte e faz sentido. Se a gente ficar pensando muito, é capaz da dona morte chegar em grande estilo numa capa preta com a sua foice. Ninguém pensa na morte porque a gente quer viver.

Eu também nunca tinha parado pra pensar em todos esses pormenores até perder alguém especial, afinal sempre foi tudo muito simples em vida. Mas viver é fácil, difícil é morrer.

P.S: dinda, essa crônica foi escrita baseada na sua partida. Você sempre foi uma pessoa muito prática, mas olha o trabalho que você deixou… Eu ainda te amo e continuarei te amando. Obrigada por tudo s2

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Alessandra da Veiga

Escrevo. Poeticamente e profissionalmente. Sou jornalista e redatora SEO, mas aqui escrevo o que eu quis dizer. Do meu coração para seu dispositivo móvel.